Hagia Sophia

Hagia Sophia é uma Igreja que está localizada em Istambul, Turquia, além disso, em grego Hagia Sophia significa Santa Sophia, que é a suprema sabedoria, figura feminina da alma divina, metade mulher, metade anjo.

20.10.06

Pela Última Vez

Foi assim que aconteceu, mais uma vez, essa vez que sempre Sophia diz que será a última, mas logo em seguida se permite, pela última vez também quebrar as regras impostas por ela.
Sophia olha cada parte dele, seus olhos cujo brilho é intenso, suas mãos perfeitas e bem cuidadas, suas longas pernas, seus movimentos que possuem um ritmo que lhe faz dizer sim para o encontro com a morte, pela última vez.
É um paradoxo associar a morte ao seu encontro, mas para Sophia é tudo tão óbvio, tão claro que a cada vez que ele lhe toca, morre uma parte de seu corpo, ainda que ela possua uma vontade louca de viver intensamente. Mas Sophia sabe quem está lá, escondida torcendo para que aconteça de novo, ainda que seja pela última vez.
A hora é marcada e uma alegria percorre o corpo de Sophia. Mas essa é uma sensação frágil, ilusória e em breve, muito breve ela irá embora, junto com uma parte sua.
Sophia sobre as escadas tensa, com parcimônia, como se aquela última vez fosse a primeira. Arruma os cabelos, respira fundo e entra com um sorriso nervoso, mas há algo naquele sorriso de ordem sincera, é bom estar lá e deixar seu coração bater simplesmente para dar mais velocidade ao seu sangue que corre nas veias.
Lá Sophia não tem nome, não importa, tanto faz, pois ele também não tem. Sophia retira a máscara que lhe foi colocada quando ela ainda não podia argumentar e a colocou em cima da mesa, junto aos seus livros. Escondida no canto direito está ela, observando tudo, a diferença é que ela sabe que aquela não será a última vez.
Sophia o explora novamente com os seus olhos, agora livre da máscara, cada parte sua e deseja que ele também esteja fazendo isso.
Dá-se início ao ritual, aquilo preenche todas as suas lacunas, dela e dele e aquele dia ele conseguiu proporcionar a Sophia algo que ela nunca havia sentido. Sophia saiu do seu corpo que pulsava involuntariamente, enxergou sem cor e quando se deu conta seu corpo estava completamente dormente. Sophia tinha vontade de explodir de alegria e queria que ele soubesse como ela estava feliz. Suas mãos sem coordenação tentavam o explicar isso a cada vez que ela o arranhava quando seus dedos se comprimiam na pele dele. A boca de Sophia secou, seus pensamentos sumiram e todo controle sobre seu corpo havia desaparecido. Somente ele tinha controle e em alguma instância daquele momento, Sophia pensou que tudo podia acabar ali para sempre, com ela sem comandos e sem idéias, mas com aquela sensação inexplicável de vida e morte dentro dela. Sem ter que se lembrar quantos anos tinha ou de onde vinha recuperou seus sentidos tocou o corpo dele por puro afeto e se sentiu vazia, porém bem.
A morte assistiu tudo lá no cantinho, contente por estarem contentes e por não se machucarem, por terem deixado seus corações apenas com a função de bater compassadamente para sustentar a ânsia que tem um pelo outro. Ânsia, carinho, afeto, desejo.
Nesse dia Sophia morreu mais um pouquinho, cada célula morta dele que ficou na sua unha, é um minuto de vida a menos que terão ou deixarão de ter.
Naquele dia ele disse que provavelmente se encontrariam de novo e Sophia olhou nos seus olhos e riu. Ela colocou a máscara, arrumou seus cabelos, desceu as escadas e aquela fina e frágil casca chamada alegria se quebrou, e seu personagem se recorda do seu nome, da sua idade e de onde veio. Lembra-se que necessita ter angustias, medos, raiva e culpa. Aí repete que foi a última vez. Seu coração se enche de futilidades que a aturdem e deixam sua expressão pesada.
Mas, na semana seguinte Sophia o viu de novo e assim que o olhou nos olhos pensou que aquilo tinha que ser repetir e que pela última vez ela precisava sair da sociedade e colocar a sua máscara em cima daquela mesa junto aos seus livros, com o coração somente bombeando seu sangue, com a morte os espiando e dando um sorriso cínico da sua certeza que o ritual se concretizaria mais uma vez, talvez, pela última vez.

bjs
Paty